Samuelson Paulo
A noite estava bem escura por conta do desaparecimento da lua, até ela teve medo do
que estava acontecendo. A noite trocou a sua companheira habitual pelo som do batuque
e pelas danças da minha terra.
Tudo estava diferente, o aroma do ambiente estava estranho, não sabia como havia
parado naquele lugar, aos poucos comecei a ouvia a voz da minha falecida avó Duva no
corpo de um senhor, ao ver aquilo, perguntei-me se não seria um novo tipo de mágica, a
resposta surgiu quando a voz chamou o meu nome, e perguntou-me o por quê de nunca
mais ter ido regar as plantas da sua campa,—logo tive a certeza de que aquilo era um
espectáculo.
Apesar dos sons das timbilas e dos batuques que faziam-se sentir, o espectáculo não era
musical, mas sim espiritual, onde o artista do cartaz era a minha avó encarnada num
corpo estranho.
A minha avó disse que havia preparado bênções para a minha vida, mas que cancelou
por causa da minha deslealdade, pois eu havia a traído com a minha namorada, ao ouvir
aquilo, não acreditei que quando ela dizia que eu era o seu esposo falava num sentido
verdadeiro.
O medo tomou conta de mim, mas logo ela disse que estava brincando, finalizando,
disse que a minha namorada era muito bonita e respeitosa, por fim ela disse que tem
feito de tudo para estar perto de mim.
Ao ouvir aquelas palavras, tive mais a certeza que era a vovó falando, ela era assim,
falona, mas no fundo uma boa pessoa.
Num tom de saudade disse que há bom tempo que queria falar comigo, pois
precisávamos de renovar o nosso contrato familiar, e para que isso aconteça, ela quer eu
compre: “uma capulana vermelha e branca, uma galinha cafreal, um vinho tinto e trazer
uma garrafa de dois litros com água do cemitério Lhanguene”, pois foi lá onde fora
enterrada. Finalizando disse que deveria comprar estas coisas com o meu próprio
dinheiro, não deveria pedir a ninguém e muito menos emprestar—enfatizando.
A vovó já bebe vinho?— perguntei porque em vida ela não bebia tudo que era
composto por álcool.
Respondendo disse-me: não há como não beber meu neto, a morte obriga-nos, não é
fácil ver o sofrimento que estão passando ai por cima da terra. E a bebida é o sangue dos
falecidos, é por isso que, o seu pai quando compra algo depois coloca uma bebida no
chão apresentando-me a novidade, não há como pedir algo em mim sem dar-me o que
quero.
Aos poucos a voz da vovó Duva ficava fraca, como se estivesse saindo do corpo do
senhor estranho que estava em minha frente, quando a voz desapareceu, o senhor disse-
me que queria ser pago um valor de 2mil para poder fazer todo tratamento. Eu já estava
calmo, os sons dos batuques não traziam mais medo.— talvez as batucadas fizessem
parte da festa dos que estão por baixo da terra.
Quando estava para levantar, o senhor começou a estremecer e a gritar, a voz daquele
senhor havia engrossado, da sua boca saíam palavras duras dizendo que eu não seria
nada por causa do que a irmã do meu padrasto me fizera. Ela fez um pacto com um
espirito forte (Espirito da Desgraça), por isso que a minha vida não está boa. Rindo,
aquela voz disse que não era à toa que estava dentro de uma palhota, continuando, disse
que se eu não me juntasse a minha tia, dando dinheiros, nada valeria a pena, poderia ir
para onde eu quisesse, mas o espírito não deixaria de amaldiçoar a minha vida. Dentro
de mim, vozes diziam para eu negociar com a minha tia, pois eu ainda era novo e não
aguentaria viver ao lado da dor de ser um “Zé ninguém”. Quando perguntava quanto era
necessário para eu comprar a minha vida e o espirito sair do meu corpo, comecei a
escutar mais uma voz familiar, prestei mais atenção para saber de quem era, os sons
ficavam mais fortes como se a pessoa estivesse ao meu lado, o senhor estranho não
parada de dizer palavras maléficas. Foi quando percebi que a voz era da minha mãe, ela
estava perguntando-me o por quê de eu ter dormido sem jantar e mais coisas. Por fim,
disse que era a hora de eu acordar, se não, atrasaria na escola.